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No fiel da balança: trabalhos visam aperfeiçoar o tratamento da obesidade

Dois pequenos artigos “inovadores”, na edição de julho do periódico Obesity propõem tipos de capacitação para os estudantes de medicina e critérios de conduta para os profissionais no atendimento de pacientes com obesidade, o que um especialista espera que contribua para o avanço da área.

“Esperamos que os critérios de atendimento e de formação prescritos na Obesity resultem na reforma dos nossos sistemas de atendimento da obesidade na saúde e na educação médica”, escreveu o Dr. W. Timothy Garvey, médico e professor de medicina do Departamento de Ciências da Nutrição da University of Alabama, em Birmingham, em um comentário que acompanhou os dois artigos.

O primeiro artigo apresenta um conjunto de 32 tipos de capacitação relacionados com a obesidade para serem ensinados e avaliados nos programas de educação médica para estudantes da graduação e da pós-graduação dos cursos de medicina e enfermagem.

O segundo artigo é uma proposta de padronização do atendimento da obesidade para todos os profissionais de saúde.

Os dois artigos, disse o Dr.  Timothy, “constituem um marco que irá impulsionar a evolução do atendimento dos pacientes com obesidade”.
32 competências a serem desenvolvidas na faculdade

O primeiro artigo é do Dr. Robert F. Kushner, médico da Northwestern University Feinberg School of Medicine, em Chicago, Illinois, Estados Unidos, e colaboradores, representando a Obesity Medicine Education Collaborative(OMEC) – uma iniciativa entre sociedades, liderada por três instituições, a The Obesity Society (TOS), a American Society for Metabolic and Bariatric Surgery(ASMBS) e a Obesity

Medicine Association (OMA), com a participação global de 15 sociedades médicas* e endossada por outras 20 sociedades.**

O objetivo da OMEC é criar uma capacitação direcionada para a obesidade e critérios para os programas de educação médica.

Uma força-tarefa formada por representantes de 15 sociedades médicas elaborou 32 competências relacionadas com a obesidade que foram submetidas à revisão interna, ajustadas depois obter consenso e, a seguir, enviadas para revisão externa e solicitação de críticas e sugestões de outras 16 sociedades.

As competências foram desenvolvidas para “padronizar o processo de avaliação do programa de formação para o atendimento da obesidade na faculdade de medicina, na residência, nos cursos de especialização, e na enfermagem”, segundo Dr. Robert e colaboradores.

Há necessidade desse tipo de documento, porque “um grande desafio que os atuais docentes da área médica enfrentam atualmente é a oferta de uma formação adequada para os atuais e futuros profissionais de saúde em termos de prevenção e tratamento da obesidade”, disse o Dr. Robert, ex-presidente da TOS, em uma declaração da organização.

As competências, disse o médico, “fornecem o referencial teórico para melhorar a formação profissional e, consequentemente, também melhorar o atendimento ao paciente no tratamento da obesidade”.

As 32 competências abrangem seis áreas: aprendizado durante o atendimento e aprimoramento (5 tipos), habilidade de tratar do paciente e fazer procedimentos (5), sistema de atendimento (4), conhecimento médico (13), facilidade de comunicação pessoal (3) e profissionalismo (2).

Exemplos de tipos de competências que os alunos precisam dominar são:

 

• “Obter uma anamnese abrangente direcionada à obesidade”.
• “Aplicação do conhecimento das diretrizes sobre o tratamento da obesidade para a elaboração de planos terapêuticos inclusivos e personalizados.”
• “Uso de linguagem apropriada (…) sem vieses nem julgamentos, respeitosa e empática ao se comunicar com os pacientes obesos.”


 

Projetando um curso para a formação dos profissionais de saúde

O Dr. Ethan Lazarus, médico especializado em perda ponderal do Clinical Nutrition Center, em Denver, Colorado, e vice-presidente da OMA, disse que um relatório de 2016 da American Medical Association (AMA) revelou que a formação médica do tratamento da obesidade não é nem coerente, nem abrangente.

“A OMEC representa um grande passo no sentido de preencher essa importante lacuna acadêmica, sendo oferecida como uma ferramenta gratuita*** que pode ser usada em todos os níveis da formação médica”, afirmou em um comunicado da OMA.

A Dra. Wendy Scinta, médica e presidente da OMA, concordou, observando: “Durante anos, a obesidade tem sido mal compreendida.”

“O objetivo do nosso esforço com várias sociedades e tipos de profissionais relacionados com a saúde é remover o viés e assegurar que a obesidade seja entendida adequadamente como uma doença pelos profissionais de saúde na faculdade de medicina, na residência, na especialização e em outros contextos acadêmicos. Esta capacitação define o nível da formação em obesidade e isso vai beneficiar imensamente os pacientes obesos e os profissionais que tratam deles”, reforçou a Dra. Wendy.

O Dr. Timothy escreveu em seu comentário que a infraestrutura criada pela OMEC “oferece um estímulo formidável” e “projeta um curso para a formação de médicos e profissionais de saúde que atuam na medicina da obesidade”, o que é “muito necessário”.

E embora esta capacitação vise a medicina e a enfermagem, “esta estrutura poderia ser facilmente adotada na formação de outros importantes profissionais membros da equipe de tratamento da obesidade, como nutricionistas, educadores e especialistas em comportamento, fisioterapeutas e psicólogos clínicos”, acrescentou.

O Dr. Timothy também observou que o leitor é encaminhado para um site ou para acessar o esquema de avaliação proposto em todos os tipos de capacitação mencionados.

STOP: proposta de critérios de atendimento da obesidade representa um “salto quântico”

O segundo artigo é do Dr. William H. Dietz, Ph.D., médico, e de Christine Gallagher do Milken Institute School of Public Health da George Washington University, em Washington, DC, que representa a Strategies to Overcome and Prevent (STOP) Obesity Alliance, que visa propiciar aos profissionais de saúde, partes interessadas, organizações comunitárias, gestores e pessoas atingidas pela obesidade orientação sobre os componentes fundamentais do tratamento da obesidade baseado em evidências.

A STOP é formada por organizações empresariais, de consumidores, governamentais, de militância e por organizações de saúde. A aliança fez três mesas-redondas para criar os critérios de atendimento no tratamento de pacientes adultos com obesidade, ambulatoriais e em unidades de saúde.

“O nosso objetivo”, disse o Dr. William na declaração da TOS, “foi formular critérios práticos, tangíveis, mensuráveis e simples de atendimento no tratamento de obesidade em todos os ambientes de atendimento e representando práticas que repercutam de modo positivo na saúde das pessoas atingidas pela obesidade.”

Esses critérios destinam-se a reforçar as diretrizes elaboradas para os profissionais de saúde que tratam da obesidade, de acordo com o Dr. William e Christine, e “serem exequíveis e aceitáveis pelas partes interessadas”.

“Os princípios fundamentais (…) são a tomada de decisão compartilhada”, que inclui a participação dos pacientes na elaboração dos planos terapêuticos e ajuda a saber “quando usar terapias complementares e quando trocar os pacientes para tratamentos de maior complexidade, bem como assegurar que eles tenham acesso a níveis apropriados de atendimento, independentemente de quando tiverem ingressado no sistema de saúde”.

Os critérios afirmam ainda que “a obesidade deve ser tratada como uma doença crônica” e “os profissionais de saúde devem ser sensíveis aos vieses e aos termos utilizados na linguagem” e “receber treinamento para iniciar a conversa sobre peso”.

Dr. William e Christine acrescentaram que os profissionais de saúde devem recomendar uma dieta fundamentada em estratégias e níveis adequados de atividade física para os pacientes obesos, minimizar o uso de medicamentos que possam causar ganho ponderal, e, quando necessário, discutir e/ou prescrever medicamentos para a obesidade e/ou encaminhar para a cirurgia bariátrica.

O Dr. Timothy faz algumas críticas aos critérios propostos.

“Por um lado, esses critérios não abordam a prevenção da obesidade. Em segundo lugar, parecem excluir os pacientes com sobrepeso (índice de massa corporal ou IMC de 25,0 a 29,9 kg/m2) do paradigma terapêutico”, observou.

Em terceiro lugar, ao tratar a obesidade como doença, “poderia haver uma integração mais explícita sobre a existência e a gravidade das complicações relacionadas com a obesidade nas decisões terapêuticas, de modo que a estratificação de risco possa servir de estratégia para as intervenções mais radicais para os pacientes de alto risco”.

Mesmo assim, “as normas recomendadas representam um salto quântico no avanço da formulação de um atendimento de qualidade e baseado em evidências para os pacientes obesos”, ressaltou.

Primeiros passos fundamentais: “muita coisa no fiel da balança”

O Dr. Timothy resume em seu comentário, “o cerne da questão é o viés de que a obesidade é uma escolha de estilo de vida e não uma doença crônica que merece um modelo clínico de prevenção e tratamento em sua plenitude”.

“Este viés é uma antítese abjeta das evidências científicas, mas, todavia, é prevalente entre o público leigo, muitos profissionais de saúde e regulamentadores. O resultado é a falta de acesso dos pacientes a tratamentos baseados em evidências em nossos sistemas de saúde”.

Tomados em conjunto, “os dois documentos nem começam a abordar todo o necessário para promover o preparo do paciente, nem os esforços indispensáveis para a prevenção da obesidade que exijam alterações no ambiente construído, no abastecimento de alimentos e na transmissão de mensagens sobre um estilo de vida mais saudável”.

Mesmo assim, “estes (primeiros) passos são cruciais para a evolução de um modelo abrangente de atendimento da obesidade em termos de prevenção e tratamento”.

*American Association of Clinical Endocrinologists (AACE), American College of Obstetricians and Gynecologists, American Association of Nurse Practitioners (AANP), American Academy of Physician Assistants (AAPA), American College of Lifestyle Medicine, American College of Preventive Medicine, American Osteopathic Association, American Association of Colleges of Osteopathic Medicine, American Society for Nutrition, Endocrine Society, Society of Behavioral Medicine, and Society of General Internal Medicine.

**As competências relacionadas com a obesidade na formação médica foram endorsadas por AAPA, AACE, AANP, American Board of Obesity Medicine, ASMBS, American College of Surgeons, Association for Bariatric Endoscopy, American Medical Woman’s Association, AND, American College of Osteopathic Pediatricians, American Society for Gastrointestinal Endoscopy, Endocrine Society, Obesity Action Coalition, OMA, Society of General Internal Medicine, Society of Behavioral Medicine, Society of Teachers of Family Medicine, TOS, World Obesity Federation, e Obesity Canada.

 

Os autores do artigo sobre “tipos de capacitação relacionada com a obesidade na formação médica” informaram não ter conflitos de interesse. O artigo sobre a “proposta de padronização do atendimento da obesidade para todos os profissionais de saúde e partes interessadas” foi financiado por uma bolsa de pesquisa da empresa Novo Nordisk. O Dr. William H. Dietz informou fazer parte do conselho científico dos Vigilantes do Peso. Christine Gallagher informou não ter conflitos de interesse financeiros relevantes ao tema. O Dr. W. Timothy Garvey informou receber honorários das empresas Sanofi, Novo Nordisk, Amgen, American Medical Group Association, BOYDSense e Gilead, e financiamento das empresas Merck, Pfizer, Novo Nordisk, Astra Zeneca eSanofi sem relação com o trabalho em tela.

 

Nota ao leitor:

As notas acima são dirigidas principalmente aos leigos em medicina e têm por objetivo destacar os aspectos mais relevantes desse assunto e não visam substituir as orientações do médico, que devem ser tidas como superiores a elas. Sendo assim, elas não devem ser utilizadas para autodiagnóstico ou automedicação nem para subsidiar trabalhos que requeiram rigor científico.

 

Referência: https://portugues.medscape.com/verartigo/6503770#vp_3