O rastreamento do câncer colorretal (CRC) pelo exame de sangue oculto nas fezes (SOF) melhora mais os desfechos para os homens do que para as mulheres, especialmente para os homens com tumores de cólon descendente, dizem pesquisadores finlandeses. A conclusão vem de uma nova análise dos dados de um grande estudo de rastreamento.
O programa finlandês de rastreamento pelo exame de sangue oculto nas fezes (2004 a 2011) foi realizado em mais de 320.000 homens e mulheres entre 60 e 69 anos de idade. Os participantes foram aleatoriamente designados para os braços do rastreamento e do controle. Os resultados deste ensaio, publicado em 2015, não encontraram diferença de mortalidade por câncer colorretal entre os dois braços, contrariamente às conclusões de vários estudos randomizados de rastreamento feitos anteriormente.
Agora, uma equipe de pesquisadores liderada pela Dra. Laura Koskenvuo, Ph.D., cirurgiã gástrica da Helsingin seudun yliopistollinen keskussairaala, na Finlândia, analisou novamente esses dados para avaliar “além dos desfechos de mortalidade”.
Os pesquisadores descobriram que a triagem pelo exame de sangue oculto nas fezes a cada dois anos “parece ser eficaz em termos de melhorar vários desfechos para os homens, mas não para as mulheres”.
Foi particularmente benéfico entre os homens com tumores de cólon descendente. Neste subgrupo, o rastreamento pelo exame de sangue oculto nas fezes foi associado a melhor sobrevida global, menor número de ressecção não radical e menos necessidade de quimioterapia pós-operatória.
No entanto, estes benefícios não foram observados entre as mulheres, nem entre os homens ou as mulheres com tumores de cólon ascendente.
A pesquisa foi publicada em 21 de novembro no periódico British Journal of Surgery.
A equipe sugere que, dado que o rastreamento pelo exame de sangue oculto nas fezes não parece estar associado a maior sobrevida para as mulheres, “deve-se considerar o rastreamento por outros métodos, em diferente periodicidade ou em outra idade para as mulheres”.
Detalhes dos resultados
O estudo finlandês sobre rastreamento pelo exame de sangue oculto nas fezes contou com a participação de cerca de 41% dos finlandeses na faixa etária do estudo (de 60 a 69 anos), homens e mulheres, até o final 2011.
Embora não tenha encontrado diferença significativa de mortalidade entre o câncer colorretal do braço do rastreamento e o do braço de controle, seus resultados sugerem que houve redução da mortalidade relacionada com a doença pelo rastreamento entre os homens e aumento entre as mulheres. Essa constatação também foi observada em outros estudos sobre a realização bienal do exame de sangue oculto nas fezes, comentaram os pesquisadores.
“Praticamente não foram encontrados exames de rastreamento do câncer exibindo impacto na mortalidade geral” comentou a Dra. Laura em um comunicado à imprensa.
“No entanto, estes exames ainda podem ter alguma utilidade. Queríamos ver se os pacientes poderiam evitar os tratamentos mais fortes se tivessem participado do rastreamento do câncer colorretal”, explicou a pesquisadora.
A equipe, portanto, coletou dados sobre diagnósticos de câncer colorretal do registro de câncer finlandês e analisou os prontuários médicos dos pacientes para identificar o estágio TNM clínico e patológico; os sintomas e a extensão da cirurgia; a necessidade de cirurgia de urgência, colostomia ou quimioterapia; e os diagnósticos histopatológicos.
Dentre as 321.311 pessoas no estudo, foram detectados 743 casos de câncer colorretal no braço do rastreamento e 617 no braço de controle.
Os pacientes no grupo do rastreamento tiveram mais probabilidade de remoção bem-sucedida do tumor inteiro, menor probabilidade de precisar de quimioterapia e menor probabilidade de fazer cirurgia de urgência.
“O grupo de controle fez 50% cirurgias de urgência a mais, 40% remoções incompletas do tumor a mais e 20% quimioterapias a mais do que os pacientes no grupo do rastreamento”, explicou o coautor Dr. Ville Sallinen, Ph.D., médico e professor adjunto da Helsingin seudun yliopistollinen keskussairaala.
O câncer colorretal foi menos comum nas mulheres do que nos homens, com incidência de 0,34% vs. 0,50%.
As mulheres foram menos propensas a serem assintomáticas do que os homens, 16,7% vs. 22,0 .
A dor abdominal foi o único sintoma cuja prevalência foi mais significativa nas mulheres do que nos homens.
As mulheres foram significativamente mais propensas a tumores no cólon ascendente do que os homens, 32,0% vs. 21,3%.
Os tumores dos pacientes no braço do rastreamento foram de menor categoria T, N e M em comparação aos tumores no braço de controle.
Entre os homens com câncer de cólon descendente no braço do rastreamento, os tumores foram de menor categoria N e M do que nos pacientes do braço de controle.
Entre os homens com tumores de cólon descendente, os do braço de controle tiveram mais probabilidade de fazer ressecção não radical do que os do braço do rastreamento, 26,2% vs. 15,7% e foram mais propensos a fazer quimioterapia pós-operatória, 61,6% vs. 48,2%.
A sobrevida foi pior no braço de controle do que no braço do rastreamento para os homens com câncer colorretal, mas não foi diferente entre as mulheres.
Entre os homens, a sobrevida global em cinco anos foi de 68,8% no braço do rastreamento, comparada a 61,5% no braço de controle. Entre as mulheres, os percentuais foram de 70,7% e 71,5%, respectivamente.
Em relação à lateralidade do tumor, para os homens com tumores de cólon descendente a sobrevida foi melhor no braço do rastreamento do que no braço de controle.
Contudo, este benefício de sobrevida não foi observado nos homens com tumores de cólon ascendente. A sobrevida não sofreu alteração pela lateralidade do tumor nas mulheres.
A coautora, Dra. Nea Malila, Ph.D., diretora do registro de câncer da Finlândia, em Helsinque, disse que o tamanho da amostra é uma força do estudo.
“O estudo randomizou um número enorme de pessoas do sistema público de saúde, o que significava que poderíamos avaliar objetivamente os benefícios do rastreamento”, observou.
“Não há estudos semelhantes disponíveis em lugar nenhum”, disse a Dra. Nea.
“No futuro, devemos examinar se diferentes técnicas de triagem poderiam melhorar a situação dos pacientes do sexo feminino e facilitar o diagnóstico do câncer de cólon ascendente”, concluíram os pesquisadores.
O estudo foi financiado pelos fundos de pesquisa de Vatsatautien Tutkimussäätiö, Helsingin seudun yliopistollinen keskussairaala, pela Mary and Georg Ehrnrooth Foundation e pela Syöpäsäätiö. Autores e editorialistas informaram não ter conflitos de interesses relacionados com o tema.
Nota ao leitor:
As notas acima são dirigidas principalmente aos leigos em medicina e têm por objetivo destacar os aspectos mais relevantes desse assunto e não visam substituir as orientações do médico, que devem ser tidas como superiores a elas. Sendo assim, elas não devem ser utilizadas para autodiagnóstico ou automedicação nem para subsidiar trabalhos que requeiram rigor científico.
Referência: Br J Surg. Publicado on-line em 21 de novembro de 2018.
https://portugues.medscape.com/verartigo/6503032#vp_2