Las Vegas — Pesquisadores criaram uma calculadora para prever o risco de eventos adversos cardiovasculares maiores (MACE, sigla do inglês Major Cardiovascular Event) ou morte em 10 anos entre os pacientes com diabetes tipo 2 e obesidade, dependendo de se o paciente decide fazer a cirurgia bariátrica ou não.
A calculadora de risco está disponível no site da Cleveland Clinic e em breve estará disponível como aplicativo (BariatricCalc), segundo o Dr. Ali Aminian, cirurgião bariátrico na instituição, explicou na Obesity Week 2019.
A calculadora exige a inserção de 26 variáveis do paciente e quantifica os resultados para os dois cenários (com ou sem cirurgia bariátrica).
“Agora você tem dois números, dois valores, que podem ser comparados para decidir qual caminho seguir”, disse Dr. Ali.
A calculadora mostra, disse ele, que “a perda ponderal, a remissão do diabetes e a melhora da pressão arterial, do colesterol e dos fatores de risco cardiometabólico” observadas com a cirurgia bariátrica “terão um impacto significativo na redução do risco de infarto agudo do miocárdio, acidente vascular cerebral, insuficiência cardíaca, insuficiência renal e morte”.
O instrumento também indica a probabilidade de complicações da cirurgia para cada paciente.
O Dr. Ali disse que a “calculadora pode oferecer um vislumbre do futuro para os pacientes com diabetes e obesidade, e demonstrar o impacto que o atendimento convencional comparado à cirurgia bariátrica teria no risco de morrer ou de complicações importantes”.
“Isto irá fundamentar melhor as decisões e as recomendações médicas, e esperamos que leve à melhora do atendimento e dos desfechos para o paciente”, acrescentou.
Convidado a comentar, o Dr. Oliver A. Varban, também cirurgião bariátrico, disse que “estas calculadoras são muito importantes”.
A clínica cirúrgica acumula esse tipo de dado de risco, observou Dr. Oliver, da University of Michigan, nos Estados Unidos, enquanto que este tipo de conhecimento, ou de dado, não está disponível para os médicos do atendimento primário ou os endocrinologistas que fazem o tratamento clínico da obesidade, disse o cirurgião.
“Em Michigan, temos uma calculadora de risco semelhante que avalia tanto os resultados da perda ponderal como as complicações, sendo específica por procedimento (por exemplo, derivação em Y de Roux ou gastrectomia vertical)”, observou o Dr. Oliver.
Os médicos podem usar a calculadora de risco para cada paciente. “Nós dizemos, ‘baseado em pessoas semelhantes a você, podemos comparar estes procedimentos'”, e identificar as potenciais complicações e a perda ponderal.
Poucos pacientes com indicação fazem a cirurgia bariátrica
Apesar dos benefícios descritos da cirurgia bariátrica, menos de 1% dos pacientes com indicação fazem o procedimento, disse o Dr. Ali aos delegados na Obesity Week 2019, em parte, possivelmente por falta de conhecimento sobre seus potenciais resultados.
Para preencher esta lacuna de conhecimento, Dr. Ali e sua equipe de pesquisa criaram a calculadora de risco para os pacientes com diabetes tipo 2 e obesidade.
Primeiro os pesquisadores identificaram 288.692 pacientes com diabetes tipo 2 acompanhados no Cleveland Clinic Health System entre 2004 e 2017.
Destes, 2.287 pacientes com obesidade (IMC > 30 kg/m2) fizeram a cirurgia bariátrica, e cada um foi pareado a cinco pacientes, chegando a 11.435 pacientes tratados de modo convencional no grupo de controle.
O Dr. Ali apresentou os resultados do estudo caso-controle no recente congresso da European Society of Cardiology (ESC 2019), World Congress of Cardiology, simultaneamente publicados no periódico JAMA, como informado. O estudo foi financiado pela empresa Medtronic.
A calculadora foi criada a partir de um modelo de previsão baseado nos resultados do estudo.
No grupo da cirurgia, 63% dos pacientes fizeram derivação em Y de Roux, 32% fizeram gastrectomia vertical e 5% colocaram banda gástrica.
A equipe, então, explorou 26 fatores de risco como diferentes desfechos, inclusive o risco de morte, neste grande grupo de pacientes. Foram usadas técnicas estatísticas tradicionais e por aprendizado de máquina (machine learning) para identificar os modelos de previsão mais precisos para cada desfecho e estes modelos foram inseridos na calculadora.
A calculadora de risco, portanto, trabalha com os seguintes dados.
• Demográficos: idade, sexo, índice de massa corporal, raça e tabagismo;
• História clínica: hipertensão arterial sistêmica, dislipidemia, doença pulmonar obstrutiva crônica, insuficiência cardíaca, doença coronariana, doença cerebrovascular, neuropatia diabética , doença arterial periférica, nefropatia diabética e diálise;
• Clínicos e laboratoriais: hemoglobina glicada (%), pressão arterial sistólica e diastólica (mmHg), creatinina (mg/dL) e triglicerídeos (mg/dL); e
• Medicamentos atuais: insulina, antidiabéticos não insulínicos, hipolipemiantes, inibidores da enzima conversora da angiotensina ou bloqueadores dos receptores da angiotensina, outros anti-hipertensivos, ácido acetilsalicílico e varfarina.
Informações sobre os riscos baseadas em evidências e personalizadas para os pacientes
Para ilustrar como funciona, o Dr. Ali inseriu valores hipotéticos na calculadora de risco on-line.
O pesquisador mostrou que, se este paciente continuar o mesmo tipo de tratamento clínico, seu risco de morte em 10 anos é previsto como sendo de 6,6%, mas se fizer a cirurgia bariátrica, o risco cai para 3,7%.
As limitações do estudo foram os possíveis erros de codificação e a ausência de dados sobre variáveis relevantes (como duração do diabetes e história familiar de doença coronariana).
Os pesquisadores também não compararam os resultados após os diferentes tipos de cirurgia bariátrica e o modelo não foi validado em uma coorte externa.
E no estudo caso-controle feito para estimar o risco, menos de 10% dos pacientes do grupo de tratamento clínico tomavam agonistas do peptídeo 1 semelhante ao glucagon (GLP-1, sigla do inglês Glucagon-Like Peptide-1) ou inibidores do cotransportador 2 de sódio-glicose (SGLT2, do inglês Sodium-Glucose Cotransporter 2), que são cardioprotetores, portanto se algum médico tiver diante de si um paciente usando esses novos medicamentos para o diabetes tipo 2, a calculadora pode superestimar seu risco cardiovascular.
No entanto, “a realidade é” que esses medicamentos ainda não estão disponíveis para todos por causa de seu custo, disse Dr. Ali.
Apesar dessas limitações, a pontuação de risco “oferece informações personalizadas sobre o risco, baseadas em evidências, para os pacientes com diabetes tipo 2 e obesidade”, afirmou o autor.
Os pesquisadores agora planejam testar a calculadora de risco em um estudo randomizado e controlado, para ver se a sua utilização vai modificar as decisões dos pacientes e a respectiva opinião sobre a cirurgia.
Obesity Week 2019. Apresentado em 05 de novembro de 2019.
Nota ao leitor:
As notas acima são dirigidas principalmente aos leigos em medicina e têm por objetivo destacar os aspectos mais relevantes desse assunto e não visam substituir as orientações do médico, que devem ser tidas como superiores a elas. Sendo assim, elas não devem ser utilizadas para autodiagnóstico ou automedicação nem para subsidiar trabalhos que requeiram rigor científico.
Referencia: https://portugues.medscape.com/verartigo/6504221#vp_2